quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Da série cachimbeiros de verdade com o confrade José de Anchieta Toschi (Balkan Sobranie)



Prezado confrade Balkan Sobranie, primeiramente gostaria de agradecer ao confrade por aceitar participar de nossa série Cachimbeiros de Verdade e dizer que é um prazer tê-lo conosco como entrevistado, visto a grande bagagem que possui no tocante a nossa querida arte, sendo um profundo conhecedor desta, fato que é evidenciado nos grupos dos quais participa no facebook, sempre ativo e buscando ajudar os confrades menos experientes, bem como dando dicas preciosas até para os veteranos. 

Eu não o conheço pessoalmente, aliás, fui conhecê-lo através dos grupos do facebook, ali que percebi sua bagagem ao falar sobre tabacos bem como cachimbos, ao ajudar os mais inexperientes, bem como ao fomentar a discussão sobre vários pontos da nobre arte de cachimbar, criando sorteiros, enquetes, perguntas, enfim, enriquecendo-os! 



Em tempo, essa entrevista ficou muito didática e interessante, o confrade expõe sobre o termo Mistura Balcânica, sobre a industria de tabacos americana, fala do renomado G. L. Pease, sobre o termo "confrade" utilizado no Brasil,  enfim, é um material imperdível! Vale a pena ler! 



Com vocês nosso querido confrade Balkan Sobranie! Abaixo a entrevista "in verbis"!  





1. Confrade, como conheceu a nobre arte? Se possível, relate sua primeira cachimbada, como foi, quem lhe apresentou, qual foi o tabaco e qual foi o cachimbo?

Fumei em um cachimbo pela primeira vez numa fria noite de Inverno, junto com um amigo, há muitos anos, eu tinha 14, sentados sobre o muro de umas das casas do bairro em que eu morava em São Paulo, o Bixiga. Meu cachimbo era um Argol (nacional, de madeira comum) e o tabaco era o Bulldog, ambos adquiridos em uma padaria próxima de minha casa. Aquela minha primeira experiência, que acabou se transformando em um hábito, ocorreu por imitação a meu irmão, um fumante às sérias, vinte anos mais velho do que eu, dono de um paladar requintado e de cachimbos importados e tabacos Dunhill.
Minha primeira cachimbada ocorreu com o consentimento de meu irmão, mas sem que meu pai ou minha mãe soubessem. Naquela época era considerado desrespeitoso um filho fumar em frente a seus pais.
Dias depois, num generoso gesto de meu irmão, fumei London Mixture em um Corn Cob. Foi uma experiência inesquecível, mas com certeza não por causa do Corn Cob. Olhando para trás, hoje tenho certeza que foi naquele dia que nasceu a minha predileção pelas Misturas Inglesas e, ao mesmo tempo, foi quando constatei que meus fornilhos de Bulldog dos dias anteriores tinham sido uma experiência horrível, uma coisa verdadeiramente bestial, minhas primeiras fritadas de língua e o alerta de que os aromatizados e eu definitivamente não tínhamos nascido um para o outro. Infelizmente, por viver à custa da mesada que recebia de meu pai, ainda continuei fumando tabacos aromatizados nacionais por muito tempo.

2. Agora falando um pouco dos cachimbos de "briar", tem algum/alguns favoritos? Qual marca/artesão mais lhe agradam e o por quê?

Muitas das boas marcas de cachimbos produzidos em série estão presentes em minha estante e dentre todas elas a minha marca predileta é a Castello, tanto em aparência quanto em funcionalidade.
Quanto a cachimbos artesanais, Marco Biagini é o meu artesão preferido para cachimbos grandes, daqueles que dão longas fumadas, e Lee von Erck o meu predileto para cachimbos com aparência exótica. Ambos os escultores são excelentes e imaginosos e só se utilizam de raízes de primeiríssima, dando um aspecto excepcional a seus cachimbos que têm características construtivas praticamente perfeitas. Adicionalmente, von Erck lança mão de um sistema todo particular de cura a óleo que faz com que seus cachimbos sejam levíssimos e já desde o início deem fumadas totalmente isentas de gosto proveniente da raiz.
Hoje, como já não curto tanto cachimbos grandes ou exóticos, estou em busca de novos artesãos favoritos. Recentemente recebi um cachimbo marTelo, que já reputo entre os melhores do mundo, e estou no aguardo do recebimento de um do Bruno Robalo.

 3. Ainda nos cachimbos de "briar", poderia nos mostrar seu cachimbo ou cachimbos prediletos?

Claro, como não?

O cachimbo é um Moretti Magnum, que é a marca do mestre Marco Biagini, reparem que o socador leva inscrito o nome Balkan, socador este que o artesão utilizou-se da mesma madeira que fez o cachimbo.


4. No tocante aos cachimbos de espuma-do-mar, é um apreciador deste tipo?

Entendo que você esteja se referindo aos cachimbos produzidos em Meerschaum, confere? Bem, meerschaum não é a minha praia. Tenho alguns, que nunca me causaram grande impressão, e não pretendo adquirir outros. Também os Calabash, em parte também produzidos em Meerschaum, não estão entre os meus cem mais.

5. De todos os tabacos que provaste, quais seriam seus preferidos? Tem alguma predileção por um determinado tipo, Vaper, MI, VAs puros, etc.?

Eu poderia citar aqui tabacos magníficos, lendários, inigualáveis, mas todos eles agora pertencem ao passado, infelizmente. Não são mais fabricados e certamente não voltarão a ser, pelo menos não para voltarem a ser como um dia já foram. Não vale a pena falar neles porque a maioria dos eventuais leitores desta entrevista não teria como avaliá-los. Ao invés de falar do que já se foi, prefiro citar tabacos atualmente encontrados à venda e que aprecio para as minhas fumadas cotidianas. Mas são tabacos absolutamente comuns, sem nada de excepcional:
MI: Standard Mixture
MI + Perique: Bombay Extra
Virgínia + Perique: Escudo
Aromático: Grousemoor

6. Ainda sobre os tipos de tabacos, vi que o confrade não é adepto do termo MB - Mistura Balcânica, por quê?

Para mim, a pergunta seria o contrário: que conversa é essa de Mistura Balcânica? De onde surgiu e como surgiu esse treco? Será que era assim que os produtores europeus de excelentes Misturas Inglesas chamavam suas misturas ricas em Latakia? Como será que eles se viravam antes do desaparecimento do Balkan Sobranie Smoking Mixture? Seria então, desde sua criação, a famosa London Mixture também uma mistura balcânica? A Commonwealth também? Afinal, a partir de que teor de Latakia um mistura passa a ser considerada balcânica? Seria somente a partir de 27,693% ou já a partir 15,418%? Ridículo, não? Ou o uso do termo dependeria da percepção do fumante? Mas percepção de quê? Percepção de qual fumante? Palhaçada.
Não foi se não a partir de meados de 1990 que este termo confuso e hilariante passou a ser utilizado como designador de misturas confeccionadas ao gosto inglês. Coincidentemente, na mesma época em que surgiram novas e pretenciosas empresas americanas no mercado que, imbuídas do mesmo espírito que fazem os certos estadunidenses crerem que um dia seremos convencidos de que foram os irmãos Wright os inventores do avião, assim também querem nos fazer acreditar que seus produtos são extremamente semelhantes, quase idênticos ao paradigma, ao Santo Graal das Misturas Inglesas.
“Olha, se a gente escrever na embalagem das nossas misturas que esse troço que a gente faz é balcânico, esse caras vão começar a acreditar que o nosso produto é igual àquele que o avô deles fumava! Sim, eu sei, eu sei que não é verdade, mas quem vai provar o contrário? A gente cria uma nova categoria, entendeu? No final, tudo o que importa são os dólares entrando. Ou não?”
“Agora temos Internet? Então tome resenhas na Tobaccoreviews! E tome artigos e mais artigos do todo-poderoso homem de marketing, senhor referendador, me-engana-que-eu-gosto Gregory L. Pease!”
“Mas, o quê? Se aqueles figurões todos, se todas aquelas figurinhas carimbadas dos EUA estando falando mistura balcânica, então eu também vou falar! Caramba! Foi o G.L. Pease quem falou! E você acha que eu vou ficar atrás? Eu não, nem a pau, Juvenal.”
Aconselho darem uma atenta espiada na embalagem do Santo Graal e verificarem que tipo de tabaco os produtores daquela mistura tentavam apregoar como responsável (atenção: na opinião deles mesmos) pelas ainda hoje enaltecidas características da mistura que produziam. Mas na embalagem do Santo Graal original e não das suas tentativas de recriação.
E, se me permitem um conselho, tenham espírito crítico. Tomem cuidado com uma “verdade” repetida quase a exaustão e de modo belo, pomposo e rebuscado. Senão fizerem assim, se não forem críticos, correm o risco de acabar acreditando que Hitler é que estava certo... O G.L. Pease dele chamava-se Joseph Goebbels.
Mistura balcânica? Blah! Indústria do tabaco americana: Vá ganhar dinheiro à custa da ingenuidade alheia, não da minha.
Pra finalizar o assunto, não quero que fique a impressão de que eu não gosto do Sr. G.L. Pease. Gosto dele sim, e muito. Toda vez que eu estou de mau humor, corro para o computador e leio algum dos doutos artigos que ele escreve. Daí, adeus mau humor!

7. Isqueiro ou fósforo? Caso tenha predileção por isqueiros, qual seu modelo preferido?



Isqueiros. São muito práticos e, tomando-se o devido cuidado, são tão bons quanto os fósforos. Os meus isqueiros favoritos são os Old Boy, da Corona, dos quais tenho cinco, todos quebrados e encostados em um canto qualquer da casa. L Os Old Boy são muito bonitos, caros e... absurdamente frágeis. L. Cansado de gastar dinheiro na compra deles, acabei me valendo dos isqueiros BIC de tamanho grande, com os quais me dou muito bem. J


8. Agora falando sobre uma ferramenta inseparável dos cachimbeiros, os famosos socadores, poderia nos mostrar o seu predileto?
Como fatalmente acaba acontecendo com todo fumante de cachimbo, tenho dezenas e dezenas de socadores. De todos, o que mais gosto é um que nunca uso: é um presente que recebi do Marco Biagini e que traz o meu apelido.

9. Como o confrade traduziria o ato de cachimbar?
Um momento ampla e profundamente contemplativo.

10. Teria alguma história especial com algum tabaco ou mesmo com o cachimbo para nos contar?

Não, não me lembro de nenhuma história assim. J

11. Falando em história, sei que o confrade é amigo de longa data do nosso querido confrade Térgio Patrício, como essa amizade começou? Já cachimbaram muito juntos?

Conheci o Térgio à época da A Confraria do Cachimbo, da qual éramos ambos integrantes, e em função do muito que temos em comum, eu e o Térgio acabamos nos tornando bons amigos.
Uma coisa sobre mim e o Térgio que vale muito a pena citar é que temos paladares para tabaco que divergem frontalmente. A grande maioria das misturas que um aprecia, o outro não gosta. Nossas predileções são com água e vinho e isto nunca nos impediu de nos tratarmos com o máximo de respeito e consideração. Se fossemos, os dois, tão mal educados e grosseiros como muitos dos integrantes dos grupos de fumantes do Facebook, a esta altura já estaríamos exaustos de tanto dizer um ao outro “Isso aí que você está fumando é uma b...”. Só que isto nunca ocorreu.
Então, senhores, se acham que podem aprender alguma coisa com ele e comigo, comecem por refletir um pouco sobre o que significa amizade, respeito, consideração, dignidade.

12. Falando em confrade, esse termo, aqui no Brasil, foi introduzido pelo nobre confrade, poderia nos explicar?

Não estou certo se fui eu que introduzi este termo entre os fumantes de cachimbo das comunidades virtuais brasileiras. Mas, associado a fumantes de cachimbos, me lembro, isto sim, de nunca tê-lo ouvido antes da criação da “A Confraria do Cachimbo”, um grupo brasileiro que existiu no passado e fundado praticamente ao mesmo tempo do surgimento do Yahoo no Brasil. “Confrade” era a forma habitual dos integrantes dessa confraria tratarem uns aos outros, tantos nas conversas virtuais quanto nos Encontros ao vivo. Talvez não tenha sido eu o introdutor desse termo, talvez tenha sido outro “confrade”. J

13. Atualmente o confrade criou um grupo Vivência de Cachimbeiros, qual o objetivo principal desse grupo? É um grupo aberto? Quem quer participar como faz?

De início o grupo tinha outro nome, era a “A Escolinha do Cachimbo”, que foi criado com a intenção de sanar uma falha, a meu ver grave, de todos os demais grupos com os quais tomei contato: a falta de real interesse pelos principiantes e suas dificuldades. Mas logo percebi, até em função do péssimo nome que escolhi, que o que os iniciantes esperavam era apenas receberem aulas, nada mais. Não tinham interesse verdadeiro em participar ativamente. Limitavam-se a se comportar como quem tivesse comprado um ingresso e ficavam estatelados em suas poltronas esperando que o espetáculo começasse. Ingenuamente imaginei que mudando o nome do grupo para “Dúvidas de Principiantes” as coisas mudariam para melhor e que finalmente teríamos postagens com dúvidas e, consequentemente, iniciantes passando à condição de iniciados. Que nada, outra grande bobagem minha. Pasmo, fui obrigado a aceitar o fato de que as pessoas a quem eu oferecia ajuda não se interessavam por ela.

Mas fiz uma última tentativa alterando, mais uma vez, o nome para Vivências de Cachimbeiros, supondo que surgiriam bons samaritanos interessados em partilhar suas experiências com os iniciantes. Os bons samaritanos até que surgiram, e vários, os iniciantes é que não.


Para encurtar a história, o grupo Vivências acabou abandonando sua vocação inicial e se transformou em um pequeno grupo para amigos que gostam de conversar sobre cachimbos e tabacos.

14. Sei que o confrade é um homem ocupado, já abusando de seu tempo, qual dica/conselho daria aos iniciantes?

Dicas a iniciantes me cansei de tentar dar, o que não encontrei foi ouvinte. Fica então um conselho válido para iniciantes, iniciados, veteranos e para mim mesmo: Cuidem de não serem vaidosos, pois a vaidade tolhe a visão e distorce a percepção que temos de nós mesmos em face a realidade.

15. Teria alguma colocação final para fazer, fique a vontade!

Não, nenhuma, realmente.

Um abraço e boa sorte a todos em suas jornadas. :)

4 comentários:

  1. Ótima entrevista, como de costume!
    Gostei da parte em que o confrade José fala dos isqueiros. Eu tb já tentei usar isqueiros mais chics e apropriados, mas eles não duram. Agora, só BIC mesmo hahaha!
    Abraços a todos!

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    1. Obrigado confrade! :) Realmente confrade, ás vezes e nem tão raramente assim, o menos é mais!

      Em que pese eu não conseguir me desgrudar do Zippo quanto trata-se de acender o cachimbo! hehehehe

      Um abraço e excelentes cachimbadas!!!

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  2. Baita entrevista meu amigo. Teve que reler com o meu churchwarden cheio.

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    1. Obrigado confrade, fico feliz que tenha gostado!

      Também adorei ler essa entrevista, muito boas as palavras do confrade!

      Um abraço e excelentes cachimbadas!!!

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